Informativo sobre epilepsia/convulsões/ataques:

Informativo sobre epilepsia/convulsões/ataques:

Marcelo Bastos Valbão

A epilepsia já é conhecida desde a antiguidade e quase sempre foi cercada de mitos, preconceitos, gerando danos inumeráveis aos seus portadores. Na atualidade de modo algum se justifica tal situação, pois este problema já está muito mais esclarecido quanto a suas causas, consequências e tratamentos. A epilepsia na verdade não é uma doença, mas sim o resultado de diversas doenças diferentes que geram uma atividade exagerada em alguma região ou em todo o cérebro (descarga epiléptica, não perceptível a quem observa o paciente) e que pode ou não evoluir para a crise epiléptica (sintomas perceptíveis a quem observa o paciente ou pelo próprio).

Para se esclarecer a respeito da epilepsia dividiremos o assunto em 3 tópicos:

1 – Tipos de crises epilépticas (o que acontece com o paciente no momento da crise),

2 – Causas de epilepsia (qual o problema no cérebro que levou a epilepsia),

3 – Mitos sobre a epilepsia, 4 – Tratamento da epilepsia.

1 – TIPOS DE CRISES EPILÉPTICAS = CONVULSÕES = ATAQUES EPILÉPTICOS:

Existem muitos tipos de crises epilépticas e seria impossível tentar descrever todos neste espaço. Os diferentes tipos de crises são quase tão numerosos quanto às funções que o cérebro é capaz de exercer, daí a quantidade enorme de tipos de crises. Procuraremos nos deter nas mais comuns. Para se entender as crises epilépticas, lembremos que elas podem: a – iniciar em uma região localizada do cérebro (crises parciais); b – iniciar em todo o cérebro ao mesmo tempo (crises generalizadas); c – iniciar em uma região localizada e se espalhar para todo o cérebro (crises parciais com generalização secundária).

1.a – Crise Tônico-Clônica Generalizada: Certamente o tipo de crise mais conhecido da população geral, que quase todo mundo já presenciou alguém tendo uma, mas que provavelmente não seja a mais comum, é a crise generalizada tipo tônico-clônica. Nesta crise o paciente geralmente inicia com um grito, seguido de perda de consciência com queda e movimentos dos braços e pernas esticando e encolhendo; também com salivação, respiração ruidosa, perda de urina e fezes na roupa; quando o paciente recupera a consciência normalmente fica confuso, sonolento, com dor de cabeça e náuseas; normalmente a crise dura 15 a 20 minutos.

1.b – Crise Tipo Ausência: Outro tipo de crise que muitas pessoas já viram é a crise generalizada tipo ausência “branco”. Vale lembrar que as crises parciais às vezes podem se confundir com as crises de ausência e somente uma consulta com neurologista pode esclarecer a diferença. Na crise de ausência, que geralmente ocorre em crianças, o paciente tem uma parada súbita da atividade que estava executando, permanece poucos segundos inconsciente, imóvel, não responde a chamados e subitamente volta ao normal retornando a atividade que estava fazendo, muitas vezes sem perceber que teve uma crise; o paciente fica com fama de desatento ou que “vive no mundo da lua”.

1.c – Crises Parciais: Outros tipos de crises, que são extremamente comuns, mas que nem sempre são reconhecidos pela população geral como formas de epilepsia são as crises parciais. Lembremos que as crises parciais se iniciam em uma região localizada do cérebro e, portanto suas manifestações serão dependentes da área afetada; por exemplo:

a – se a crise inicia na área da visão – o paciente terá visão de luzes, manchas coloridas;

b – se a crise inicia na área de controle de movimentos – o paciente terá crises de movimentos de metade do corpo contra a sua vontade;

c – se a crise inicia na área da sensibilidade (tato, calor, dor) – o paciente terá crises de sensações estranhas, formigamentos, dores, em metade do corpo.

Nestes 3 tipos de crises parciais descritos acima geralmente o paciente fica acordado e percebe toda a crise sem poder fazer nada ,ele “assiste a crise” (são chamadas de crises parciais simples), apenas esperando ela parar.

d – crises parciais complexas – Em outros tipos de crises parciais, apesar da crise iniciar em uma região localizada do cérebro os pacientes perdem a consciência e não sabem o que ocorre durante a crise (são chamadas de crises parciais complexas); estas geralmente são as crises que mais demoram a ter diagnóstico, pois os pacientes demoram a reconhecer a crise como sinal de doença, não valorizam os sintomas, acham que seja algo psicológico, nervosismo, depressão, “estresse” e vão deixando o problema de lado até terem alguma conseqüência mais séria ou a freqüência das crises aumentarem muito. Sintomas comuns das crises parciais complexas são a execução de atos automáticos como mastigação, engolir, segurar e soltar objetos, sair andando sem direção, ficar parado com olhar fixo sem responder a chamados ou falando coisas sem sentido. Às vezes as crises podem ter sintomas extremamente semelhantes às atividades normais do paciente; ele continua agindo normalmente durante a crise e ninguém ao redor percebe a crise; quando o paciente volta ao normal não se lembra de nada o que ocorreu durante o período da crise, só para se ter uma idéia, os pacientes podem dirigir veículos, operar máquinas, tomar condução errada, comprar coisas, sair andando por longas distâncias; quando o paciente volta ao normal fica perplexo com a situação em que está envolvido, não conseguindo ter nenhuma explicação para ela.

image2 – CAUSAS DE EPILEPSIA:

Para um problema qualquer no cérebro gerar a epilepsia ele deve provocar a formação do chamado foco epiléptico, que é o local do cérebro onde a crise inicia, é o local onde ocorre a atividade exagerada e descontrolada do cérebro. Também neste ponto a variedade de causas é enorme, só para citar as mais comuns:

2.a – crises hereditárias – transmitidas pelos genes, quando há história de epilepsia na família;

2.b – traumatismo de crânio – pacientes que sofreram traumas na cabeça, em acidente de trânsito por exemplo;

2.c – tumores dentro do crânio – a presença de massas crescendo dentro do crânio comprime o cérebro e gera o foco epiléptico;

2.d – infecções – após meningites, abscessos cerebrais e em nossos dias não se esquecer da AIDS que pode causar epilepsia de diversas formas (meningite, toxoplasmose, ação direta do vírus);

2.e – parasitas – entre as causas mais comuns de epilepsia em nosso meio, devido à falta de saneamento e ao desconhecimento da população está a cisticercose; o cisticerco é a larva da solitária (Taenia solium) que normalmente vive na fase adulta no intestino do homem, em sua fase larvária pode viver em diversas partes do nosso corpo inclusive o cérebro gerando um foco epiléptico. A solitária (Taenia) é transmitida através da ingestão de carne de porco (Taenia solium) ou boi (Taenia saginata) mal cozidas, a carne infectada possui nódulos esbranquiçados popularmente chamados de “canjica”, às vezes as pessoas conhecem os nódulos, mas não sabem o seu significado e acham a carne que tem o problema mais saborosa! E macia! Um verdadeiro problema de saúde pública. A cisticercose é transmitida quando o ser humano ingere vegetais contaminados com fezes de pessoas que tem a solitária (Taenia solium) adulta no intestino. A epilepsia não é a única conseqüência da cisticercose pode causar também outros problemas mais sérios levando a morte.

2.f – Anóxia peri-natal – é a falta de oxigênio no cérebro por sofrimento fetal durante ou próximo ao momento do parto, parto demorado, eclampsia, descolamento de placenta.

3 – MITOS SOBRE A EPILEPSIA:

Diversos mitos tem causado sofrimento desnecessário aos portadores de epilepsia, vamos tentar desfazê-los:

3.a – a epilepsia é um sinal de loucura – não é verdade;

3.b – a epilepsia é transmitida pela saliva – não é verdade;

3.c – a epilepsia é causada por nervosismo e/ou depressão – não é verdade; o nervosismo pode agravar a epilepsia, mas certamente não é sua causa;

3.d – a epilepsia é sinal de possessão ou envolvimento por demônios, bruxarias – não é verdade.

3.e – o epiléptico não pode fazer nada sozinho pelo risco de ter uma crise – não é verdade; não só pode como deve ter uma vida o mais normal possível; para se saber o que o epiléptico pode ou não fazer a regra é muito simples, basta perguntar: Se uma crise ocorrer na situação em que estou envolvido, causarei em mim ou em outro algum ferimento grave ? Se a resposta for sim, não deve fazê-lo.

Exemplos de situações que o epiléptico deve evitar: natação em locais profundos com ou sem companhia; já, nadar em local de fácil acesso como piscinas com pessoas acompanhando e que sabem da epilepsia é razoavelmente seguro; praticar esportes radicais como surf, alpinismo, salto de asa delta, paraquedismo, mergulho profundo; profissões perigosas ou que exijam atenção de 100%, como dirigir, operar máquinas, mergulho profundo, pilotar veículos aéreos. Se analisarmos, as atividades que devem ser evitadas são as que a maioria das pessoas normalmente não executam.

3.f – O epiléptico tem menor inteligência que o normal – A inteligência pode ser afetada dependendo da doença causadora da epilepsia, mas isto nem sempre é verdade, a maioria dos epilépticos pode ter rendimento intelectual normal ou até mesmo superior à média da população.

4 – TRATAMENTO DA EPILEPSIA

A principal arma que os neurologistas utilizam para tratar a epilepsia são os medicamentos. Hoje em dia, graças ao avanço na indústria farmacêutica, já foram desenvolvidos diversos medicamentos, razoavelmente seguros e efetivos, no controle das crises epilépticas. Salientamos que, as medicações não tratam a causa da epilepsia, mas sim as crises epilépticas, reduzindo a chance de elas ocorrerem; logo se o paciente parar a medicação, as crises tendem a agravar-se novamente. Em alguns casos mais graves existe a possibilidade do tratamento por cirurgia, feita em centros especializados em cirurgia de epilepsia. Somente um médico pode chegar ao diagnóstico e tratamento seguros da epilepsia, nunca se automedique, nem altere as doses da medicação por conta própria. Caso você tenha crises semelhantes ou alguma dúvida sobre o assunto não hesite em consultar um neurologista.

image5 – O QUE FAZER QUANDO PRESENCIAR ALGUÉM SOFRENDO UMA CONVULSÃO:

5.a – Se for crise parcial simples ou parcial complexa apenas manter-se calmo, proteger a pessoa para evitar ferimentos.

5.b – Se for crise generalizada (desmaio com queda ao solo): manter a pessoa deitada de lado, não tentar levantar a pessoa até que restabeleça completamente a consciência, não é necessário fazer respiração boca-a-boca se a crise tiver duração curta (menor que 45 min.), nunca introduzir a mão ou qualquer objeto na boca da pessoa.

5.c – Em qualquer um dos casos anteriores deve-se se acionar serviço de emergência se: 1 – houver algum ferimento mais grave como cortes profundos, queimaduras, choque elétrico, contusões com formação de hematomas; 2 – a crise durar mais de 45 min. (estado de mal- epiléptico); 3 – ocorrerem crises seguidas, mesmo que de curta duração, mas que no intervalo entre as crises a pessoa não volta totalmente ao normal (crises subentrantes).

MARCELO BASTOS VALBÃO

CRM-SC 7494, RTE 4114, RTAA 5346.

Neurologista e Eletroneuromiografista

Membro Titular da Sociedade Brasileira de Neurofisiologia Clínica

Membro da Sociedade Brasileira para Estudos da Dor

 

2 Comentários

  • angelavescovi9 Publicado 30 30-03:00 maio 30-03:00 2021 3:51 PM

    Artigo exelente sobre a epilepsia, raramente aborado. Tenho 62 anos e sou portadora ada generalizada desde os 14 anos, estando totalmente sob controle a partir dos 45 anos. Meus tratamentos não foram só com neurologistas. Aos 20 anos e até aos 24 anos desenvolvi uma depressão profunda e severa e a medicação da depressão me provocava mais depressão. Parei com a medicação da depressão e comecei a procurar tratamentos complementares aos quais me especializei e hoje é o meu trabalho: Yoga e Meditação, Terapia Floral e a Acupuntura. Hoje estou estudando a MTC com ênfase na dietoterapia. Foi um salto quântico. Continuo a tomar medicação mas profiliaxia, pois hoje possuo um cérebro não epiléptico.

  • herika maria Publicado 10 10-03:00 abril 10-03:00 2016 2:08 PM

    Adorei ler este artigo sobre a epilepsia, de fácil compreensão para nós, leigos no assunto.

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